Associação ACEGIS

Filipa do Outro Lado do Espelho, Conto de uma Cientista

A convite da ACEGIS, Filipa Cavaco Peres, fala-nos da sua trajetória pessoal e de como é ser mulher no mundo das áreas STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática), do outro lado do espelho. 

Dia Internacional das Mulheres e Raparigas na Ciência

Damos VOZ às mUlheres na Ciência

—Investigadora e doutoranda no INL e pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto

Trajetória das mulheres na ciência: “ser cientista” e “ser mulher”

A convite da ACEGIS, Filipa Cavaco Peres, fala-nos da sua trajetória pessoal e de como é ser mulher no mundo das áreas STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática),do outro lado do espelho. Um artigo de opinião que reflete a trajetória pessoal, o percurso académico e os projetos de investigação de uma jovem cientista portuguesa, na qual integra a perspetiva de género entre ‘ser mulher’ e ‘ser cientista’, no mundo da Física Quântica. 

Num relato pessoal e intimista, Filipa descreve a sua história, a relação com as ciências exatas, as vivências e as suas lutas.

A 11 de Fevereiro de 2016, celebrou-se o primeiro Dia Internacional das Mulheres e Raparigas na Ciência. Implementado anualmente graças a esforços conjuntos da UNESCO, ONU Mulheres, UIT e outras instituições, este dia visa não só educar e sensibilizar o público em geral para as disparidades de género observadas nas áreas da ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM), mas também promover o contacto de raparigas jovens e adolescentes justamente com essas mesmas áreas, inspirando-as a enveredar por esse tipo de carreiras. Com esta crónica pretendo concentrar os meus esforços neste último objectivo.
Plenamente ciente de que o meu forte são os números e as equações matemáticas, e não propriamente a eloquência e a retórica, talvez não atinja a minha meta com toda a eficácia que desejaria, ou, talvez justamente por essa razão, seja muito mais eficaz do que eu própria possa antecipar.

Em todo o caso, se com esta simples rubrica conseguir que uma só rapariga se veja representada, compreendida e motivada a seguir uma carreira em ciência, considerar- me-ei satisfeita e ficarei com a sensação de dever cumprido.

Quando me sentei a ponderar o objectivo primário deste texto e como melhor atingi-lo, apercebi-me rapidamente do vasto leque de opções ao meu dispôr e, por algum tempo, senti-me assoberbada. Comecei por pensar em falar sobre verdadeiras heroínas das áreas STEM que todas deveríamos conhecer mas que, se calhar, poucas de nós conhecem. Note-se que a mim mesma me incluo neste “nós”, admitindo assim essa clamorosa lacuna que, após reflexão, percebo ser justamente o produto da narrativa e realidade enviesadas e interiorizadas na nossa sociedade e com as quais pretendo romper. Nesse sentido, essa abordagem pareceu-me perfeitamente adequada ao cumprimento do meu objectivo, munindo-me de nomes históricos e percursos excepcionais como os de Marie Curie (1867-1934), Dorothy Hodgkins (1910-1994) ou Barbara McClintock (1902-1992) para inspirar potenciais novas gerações de futuras cientistas. No entanto, cedo me desviei desta linha de escrita. Não há qualquer disputa possível no que toca à notoriedade e poder inspirador que percursos dessas mulheres detêm e, portanto, futuramente, tenciono escrever esse artigo. Mas, para este dia 11 de Fevereiro, optei por uma abordagem consideravelmente mais humilde e terra-a-terra, e também mais intimista e pessoal: a de descrever a minha própria história, a minha relação com as ciências exactas, as minhas experiências e as minhas lutas.

Para ser perfeitamente clara, de modo algum considero o meu percurso comparável às carreiras brilhantes das mulheres cujos nomes acima referi, mas é justamente por essa mesma razão que penso que esta minha rubrica pode ter um impacto bem diferente dos artigos usuais. O progresso científico não se faz apenas de figuras notáveis; ao invés, ele acontece diariamente, de modo contínuo e lento, como resultado do trabalho e da paixão de inúmeras  pessoas comuns, anónimas para a sociedade em geral, e de todos os géneros; todos os cientistas cujos nomes são agora amplamente conhecidos em todo o mundo partiram do anonimato. Na realidade, os dois ingredientes fundamentais ao sucesso são a dedicação e a paixão por aquilo que se faz; tudo o resto vem por arrasto. Mas divago… A meu ver, o contar da minha história ganha sobre a minha ideia original pelo simples facto de se tratar de um relato moderno e prático, com considerações de forte carácter pessoal, com as quais espero que eventuais jovens leitoras se possam relacionar ou onde se possam ver espelhadas. Assim, ainda que pecando pela falta de notoriedade histórica, espero que a minha crónica ganhe pelo realismo contemporâneo…

… Olhando para trás, as minhas primeiras memórias fidedignas (se é que tal existe!) remontam aos meus tempos da escola primária: ao aprender do ABC, dos números e da tabuada, da numeração romana e dos rios portugueses. Mas o tempo tratou de selecionar e realçar alguns momentos específicos. Em particular, recordo com carinho o dia em que os meus pais me passaram para a mãos um livro de jogos lógicos e numéricos; lembro-me de me deitar de barriga para baixo no chão fresco da sala de estar, de livro aberto, enquanto tentava resolver os puzzles que me eram colocados. Lembro-me de modo particularmente vívido das emoções associadas a essa experiência: do prazer e entusiasmo ao acertar na resposta certa, mas também (e sobretudo) da frustração e até mesmo da fúria perante os problemas que não conseguia resolver. Recordo-me também do meu colega Janeca e da nossa competição na resolução dos problemas de selecção para as Matematíadas que nos colocava a nossa professora primária, e da sensação de triunfo quando finalmente participei na prova em representação da escola. Recordo ainda com nostalgia as brincadeiras com as construções da Lego feitas lado a lado com o meu irmão, e os jogos de xadrez com o meu pai. No meio de todas estas memórias bem vívidas na minha mente, as lições de Português, Francês, História,
Geografia e Ciências Naturais não passam de noções pálidas e esbatidas.

No ensino básico, mais do mesmo! A Matemática era sem dúvida “o meu terreno de jogo”, a “minha praia”, a disciplina onde me sentia em casa. Competia nos torneios do jogo do 24 (que ainda hoje me divirto a jogar com as matrículas dos automóveis quando estou presa no trânsito) e participava nas Olimpíadas; de resto, nunca tive muito sucesso nestas últimas, jamais tendo conseguido passar para lá da prova regional, mas isso não me impedia de tentar e de me divertir. A partir do 3º ciclo do ensino básico conheci uma nova disciplina, de seu nome Físico-Química; embora esta não tenha conseguido suplantar a Matemática (detentora incontestável da minha paixão), conseguiu alcançar um venerável segundo lugar (ex aequo com Ciências da Natureza, talvez).

A transição para o ensino secundário ocorreu com entusiasmo e sem qualquer dificuldade na escolha da área de Ciências e Tecnologia. A Matemática A manteve-se inalcançável no seu pedestal e a disciplina de Física e Química A constituiu um misto de sentimentos contraditórios: encanto, desânimo, paixão e frustração. Na realidade, os meus 10º e 11º anos estão inextricavelmente ligados a essa sensação agridoce relativamente a essa disciplina. Umas vezes tudo era belo, claro e encaixava na perfeição na minha mente; noutras, nada parecia fazer sentido. Tenho ainda presentes de modo muito vivo as lágrimas que o sucesso a essa disciplina envolveu. Ainda assim, a escolha das 2 disciplinas específicas do 12º ano foi muito fácil: Física e Química. Isto poderá parecer estranho e aparentemente contraditório, mas a verdade é que, apesar de tudo, qualquer disciplina envolvendo raciocínio lógico, cálculos matemáticos e a compreensão do modo de funcionamento do universo era, para mim, melhor do que qualquer outra. Na realidade, os meus sentimentos relativamente às outras disciplinas eram ou de quase indiferença relativamente ao conteúdo ou então bem piores do que os meus sentimentos dicotómicos relativamente a Física e Química A. Filosofia não fazia qualquer sentido na minha cabeça e rapidamente descobri que a fórmula mágica para tirar boas notas era decorar tudo e escrever respostas o mais extensas possíveis, repetindo a mesma ideia de 30 perspectivas diferentes.Exclui-se disto, obviamente, a parte de lógica que se aprendia, na altura, no início do 11º ano; nessa parte, não tive quaisquer problemas e cheguei mesmo a ter esperanças quanto ao rumo da disciplina nesse ano lectivo, mas essas esperanças rapidamente se verificaram vãs. Biologia e Geologia, embora fizesse sentido e fosse interessante, requeria para mim um considerável esforço de memorização de termos, esquemas e processos. Esse esforço contrastava claramente com a naturalidade e clareza de tudo o que envolvesse cálculo matemático; aí bastava pegar no lápis e calcular. Não havia nada para memorizar porque todos os problemas eram sempre diferentes; a única coisa que bastava entender eram as leis e os teoremas fundamentais. Armada com essas “regras do jogo” podia fazer qualquer coisa, resolver qualquer problema. Apercebo-me agora, que sempre houve em mim algo de natural ou intuitivo no que toca a fazer contas.

Neste ponto, é importante fazer um breve interlúdio. Pode acontecer que eventuais jovens que estejam a ler esta crónica se revejam na descrição acima das minhas sensações relativas ao cálculo e pensamento matemáticos. Outras haverá para as quais disciplinas como a Biologia ou a Geologia são mais naturais e apaixonantes. Evidentemente, ambas as experiências são igualmente válidas; cada qual tem predisposição e apetência para áreas diferentes, e felizmente que assim é! O importante para mim aqui é relatar a minha história para que sirva de espelho a raparigas e adolescentes que possam, no momento presente, estar a experienciar vivências semelhantes ainda que com paixões apontadas noutras direcções.

Retomando a narrativa do meu percurso, no 12º ano tive a felicidade de ter uma professora de Física absolutamente sensacional. Com ela aprendi muito e os meus sentimentos, previamente contraditórios, deixaram de o ser. Adicionalmente, tive um professor de Matemática também soberbo, que reavivou novamente em mim a minha paixão pela Matemática, ligeiramente diminuída nos 2 anos anteriores. A Química, por outro lado, foi a grande desilusão desse ano lectivo, permitindo-me, assim, entender finalmente a dicotomia sentida na disciplina de Física e Química A.

A escolha do curso foi um momento crítico e decisivo na minha vida, repleto de ansiedades e indecisões; e penso que o mesmo será verdade para muitas jovens. Olhando agora para trás, e analisando de forma objectiva as linhas que agora escrevo, questiono-me como pude ter tantas dúvidas. Mas a resposta a essa questão é também ela agora clara para mim. Existem vários factores. Em primeiro lugar, e até perfeitamente óbvio, decisões basilares raramente são fáceis de tomar porque está muita coisa em jogo e a pressão é elevada. Por outro lado, nestas situações é também extremamente difícil alcançar o distanciamento necessário a uma tomada de decisão completamente objectiva. Além disso, as pessoas que nos rodeiam (família e amigos) e que nos tentam ajudar, são inevitavelmente tendenciosas e, apesar de apenas quererem, muitas vezes, o “melhor para nós”, não são também elas avaliadoras imparciais da situação. Aliás, essa tentativa de auxílio pode até ter o efeito oposto ao pretendido, pois acaba por causar um viés nas nossas próprias ideias, opiniões e, ultimamente, nas nossas decisões. Mais do que isso, nós próprias temos enraizados em nós preceitos, preconceitos e crenças a um nível subconsciente, mas que puxam os cordéis das nossas decisões, do nosso futuro e da nossa vida. Afastando-nos do plano dos condicionalismos internalizados e subconscientes, temos também inúmeros casos de pressões familiares e sociais, e o sentimento de que devemos agir de acordo com o que é expectável e socialmente aceite, negligenciando a honestidade para connosco.

Mais do que isso, nós próprias temos enraizados em nós preceitos, preconceitos e crenças a um nível subconsciente, mas que puxam os cordéis das nossas decisões, do nosso futuro e da nossa vida.

Penso que este último ponto é particularmente verdadeiro para as mulheres, que sofrem ainda hoje alguma pressão para seguir as convenções de uma sociedade que ainda é, quer queiramos quer não, tendencialmente machista e patriarcal, e embora os movimentos de subversão das disparidades de género estejam a produzir efeitos visíveis, ainda há muitas raparigas que são empurradas na direcção do conformismo. Finalmente, há ainda aquele que é, muitas vezes, o derradeiro factor: a empregabilidade ou, melhor dizendo, a eventual falta dela nas áreas das ciências exactas e da matemática! Este é geralmente o argumento definitivo usado para racionalizar contra uma carreira em ciência. A meu ver é também um logro! Haverá sempre lugar para profissionais qualificadas, trabalhadoras e apaixonadas; e embora seja evidente, pelos números, que a missão das mulheres é significativamente mais difícil [1, 2], também para nós é possível ter uma carreira bem sucedida e gratificante em ciência. Assim, o melhor conselho que posso dar a eventuais jovens que estejam agora nesta fase das suas vidas é que procurem distanciar-se de todas as expectativas internas e externas, de todos os supostos argumentos racionais; em vez disso, avaliem a vossa infância, os vossos gostos e paixões, conheçam-se a vocês mesmas e sejam fiéis apenas a vós próprias, porque só assim se encontra a felicidade. Claro que é mais fácil dizer do que executar…

Continuando com a minha história depois deste interlúdio, no meu caso, o megafone da (suposta) empregabilidade e das expectativas sobrepôs-se a todas as outras vozes e acabei por ser colocada na 1ª fase em Medicina. No entanto, quando esses resultados saíram, percebi de imediato que tinha cometido um grande erro, não tendo chegado sequer a ir assistir às aulas.
Em vez disso, rapidamente tratei de me candidatar a Matemática, na 2ª fase, começando afrequentar as aulas desse curso sem estar inscrita. Ao fim de duas semanas, senti que estava qualquer coisa em falta… Havia algo que não batia certo e que não encaixava pelo que, submetendo-me ao ridículo, que ainda hoje (mais de 10 anos depois) dá origem a piadas, mudei para o curso de Física na 3ª fase de candidaturas. Já diz o provérbio: “à terceira é de vez”! Ao escrever a minha história ponderei, por brevidade, omitir esta verdadeira paródia
que agora me expõe à chacota geral. No entanto, achei que a reprodução fiel da realidade poderia ser benéfica para reassegurar todas as jovens que também possam estar com dúvidas: não há mal nenhum na indecisão; ela é natural neste tipo de decisões fundamentais. Em última análise, o que conta é o resultado final e que este se coadune com a nossa realidade interior. No momento presente, e olhando para trás, orgulho-me de ter tido a coragem de mudar e encontrar o rumo certo.

De facto, depois desse começo atribulado, tudo correu pelo melhor. Acabei a Licenciatura em Física com mérito e inscrevi-me no Mestrado, também em Física, e foi nesse momento que a vida deu uma reviravolta inesperada. Após a conclusão do 1º semestre do Mestrado, fui contactada pelo Pró-reitor para a Investigação e Projectos da Universidade do Minho, o Professor Doutor Filipe Vaz, com uma proposta aliciante. A empresa alemã Leica Camera AG, muito conhecida no mundo da fotografia pelas suas máquinas e objectivas, tencionava abrir um gabinete de desenvolvimento de produtos na sua fábrica em Vila Nova de Famalicão. Para isso, necessitavam de um físico que integrasse a equipa como responsável pelo cálculo ótico indispensável ao funcionamento dos produtos. Entusiasmada, deixei o Mestrado em espera e abracei esse novo desafio. Essa experiência profissional na indústria foi extremamente enriquecedora. A Leica proporcionou-me várias oportunidades de formação na Alemanha e em Portugal que me permitiram aprender imenso, conhecer profissionais extraordinários, cultivar várias amizades e crescer a nível profissional mas também como pessoa. Estarei sempre grata às oportunidades que me foram dadas e ao investimento que foi feito em mim, mas sei também que fui merecedora deles e que os conquistei através do trabalho e paixão que dediquei a todos os meus projectos. Hoje, vejo no mercado das objectivas fotográficas vários produtos que me passaram pelas mãos e que foram minha responsabilidade de desenvolver. Posso garantir que a sensação de criar um produto a pensar
nos clientes e depois ver os seus olhos brilharem quando lhe pegam, como uma criança com um brinquedo, é extremamente recompensadora.

 

Entretanto, quando a minha posição na Leica havia já sido cimentada com segurança e as viagens à Alemanha deixaram de ser tão frequentes, decidi que estava na altura de voltar o ciclo de estudos que tinha ficado pendente, o qual concluí com nota máxima com uma tese que combinava as áreas da Física das Altas Energias e do machine learning. Eventuais leitoras poderão ficar surpreendidas com tal combinação mas, na realidade, a inteligência artificial está a tornar-se uma ferramenta extremamente importante na descoberta de “nova física”, e cada vez mais físicos trabalham em projectos envolvendo essa interdisciplinaridade.

Em 2020, em plena pandemia, resolvi aproveitar o confinamento para preparar uma proposta de projecto de doutoramento e com ela me candidatei às bolsas de doutoramento atribuídas pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT). Nesse ano, das 1360 bolsas de doutoramento, 25 foram para a área da Física e, para minha grande felicidade, uma delas coube-me a mim. Assim se iniciou mais uma etapa da minha vida profissional: deixei a Leica em Dezembro de 2020, e comecei o meu doutoramento em Janeiro de 2021, com uma bolsa
com a duração de 4 anos. O projecto que me valeu essa bolsa é mais um novo desafio, diferente dos que enfrentei na Leica e na tese de Mestrado. Para estes 4 anos, decidi voltar-me para o campo da Computação Quântica, que está neste momento a sentir um crescimento
científico desenfreado. Este é também um campo extremamente desafiante e interdisciplinar, que combina as áreas da Matemática, Física, Ciências da Computação e Engenharia Informática.
Desde que comecei, não têm havido dias aborrecidos; só desafios, excitação e
triunfos, geralmente precedidos de muito trabalho e frustração, muito como no dito livro de jogos lógicos e numéricos da minha infância.

 

A minha experiência mostra-me claramente que as mulheres são capazes de singrar numa carreira na área científica e tecnológica, quer na academia quer em contexto empresarial. Disse, e reitero, que com dedicação e paixão tudo se conquista. Simultaneamente, não sou míope (pelo menos não no sentido figurado!), e reconheço que a missão é sem dúvida mais difícil para nós, mulheres. Basta olhar para os números (como eu tanto gosto e sempre fiz ao longo de toda a minha vida) para perceber essa realidade. Uma estatística que para mim é perfeitamente flagrante é a de que embora as mulheres constituam 33% de todos investigadores, apenas 12% dos membros das academias científicas nacionais são do género feminino [1, 2]. (Estes números dizem respeito a dados recolhidos entre 2015 e 2018 pelo Instituto de Estatística da UNESCO.) De modo mais genérico, a percentagem de mulheres diminui à medida que subimos a escada de progressão na carreira.

Os dados mostram que as mulheres cientistas têm de investir muito mais suor e lágrimas para terem hipóteses de competir com os seus pares do género masculino por promoções ou aumentos salariais, e às vezes até só mesmo por um lugar numa empresa. Mas essa luta, esses esforços, não são em vão! Quantas mais mulheres cientistas qualificadas, apaixonadas e trabalhadoras tivermos nas nossas fileiras, mais força ganhamos colectivamente e mais facilmente podemos subverter os estereótipos de género que estão enraizados na nossa sociedade. No meu entender, é a partir de dentro do estabelecimento que temos o maior impacto na mudança e, embora esta luta seja difícil, morosa e cansativa, ela é também meritória. Aliás, também não se pode negar que, nos últimos anos, o paradigma tem vindo a mudar, ainda que lentamente.

Quantas mais mulheres cientistas qualificadas, apaixonadas e trabalhadoras tivermos nas nossas fileiras, mais força ganhamos colectivamente e mais facilmente podemos subverter os estereótipos de género que estão enraizados na nossa sociedade.

Gostaria de concluir deixando um agradecimento à ACEGIS, pelo convite para a escrita desta crónica, e um apelo às raparigas e mulheres que estejam a ler estas palavras para que sejam fiéis às vossas paixões. Se elas vos conduzem na direção da ciência e da tecnologia,
não se deixem intimidar! A mudança não ocorre espontaneamente, contrói-se; convido-vos a virem fazer parte da comunidade científica e transformar o mundo connosco!

 

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Referências:
[1] UNESCO research shows women career scientists still face gender bias. 2021. URL:
https://en.unesco.org/news/unesco-research-shows-women-career-scientists-still-face-gender-bias (acedido em 02/08/2022)
[2] Susan Schneegans et al. UNESCO Science Report: the Race Against Time for Smarter
Development (2021). Jun. de 2021. ISBN: 978-92-3-100450-6.

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